Internet . Do abraço genital ao abraço virtual

Internet . Do abraço genital ao abraço virtual

 

Jardel Dias Cavalcanti.

"A moral moderna desativa a ordem familiar que deveria garantir as pessoas contra os devaneios e as devastações do seu próprio desejo." (Pascal Bruckner)


Wilhelm Reich, psicanalista dissidente freudiano, acreditava que no abraço genital (o ato sexual) todas as nossas neuroses poderiam ser dissipadas. Mas isso só seria possível se o ato sexual estivesse livre de qualquer fantasia, sendo uma experiência puramente emocional-corporal, de toques na pele e nos músculos, que dissolveria o que ele chamou de couraça muscular do caráter. Essa couraça seria a cristalização de nossas neuroses pelo corpo afora, provocando o endurecimento da matéria viva e flexível que é o corpo/organismo, gerando, por isso, inumeráveis doenças no animal humano, inclusive o câncer. Reich sabia que uma barriga dura, que guarda e congela anseios reprimidos ou a barriga bem trabalhada pela musculação, impede o orgasmo livre, espontâneo e profundo que dissolve o eu no cosmos. Uma carícia bem feita nessa região e em outras era a psicanálise que ele sugeria para dissolver nossos traumas. O que seria elevar a ideia freudiana de sexualidade à milésima potência.

Na internet, o amor (no sentido total do termo, como fusão sexo-emocional dos indivíduos) parece encontrar outros termos para sua existência. Ao contrário do desejo de Reich, que valorizava a experiência corporal em si mesma, o amor virtual alimenta-se da imaginação para chegar aos seus fins. Aqui não é o corpo que está livre ou tornou-se livre para existir plenamente, mas a imaginação que é libertada de qualquer amarra para existir enquanto puro desejo no reino do ficcional.

Através da internet milhares de pessoas têm encontrado parceiros pelas madrugadas afora que jamais conhecerão pessoalmente, mas que conhecem seus desejos mais secretos, desejos que jamais poderiam ser revelados para uma parceira "real". E se são revelados para os parceiros virtuais, isso se deve ao fato de que existe a proteção do anonimato garantido pela telinha do computador.

E é desse fato, o anonimato, que vai derivar toda a experiência ousada que as pessoas têm tido, mergulhando o desejo em águas prá lá de barrentas, como me tem sido confidenciado/narrado por amigos e amigas.

E o que esse amor virtual representa no contexto da afetividade pessoal, da subjetividade atual do indivíduo? Estamos longe de saber. Mas podemos tentar mapear alguns dados sobre esta questão e as consequências dessas experiências amorosas virtuais sobre os relacionamentos ditos "reais".

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